Os seios negros alimentaram os seus algozes,
Sem recompensa além de açoite e desprezo,
A mãe servil, entre angústias ferozes,
Sustenta o mundo, mas vive em revezes.
Seus filhos choram na noite escura e fria,
Enquanto o opressor, farto, dorme em paz,
E o sangue escorre, em lenta agonia,
De um corpo escravo, que nunca se desfaz.
Os olhos negros contemplam a desgraça,
Mas guardam chamas de esperança e luta,
Pois quem carrega o jugo e a canga escassa,
Também em si traz força absoluta.
Da terra rouca, o clamor se levanta,
E entre correntes brota o grito forte,
A mãe que alimenta, em dor se agiganta,
E desafia até mesmo a própria morte.
O leite derramado em meio à chibata
Fertiliza o chão com sonhos de liberdade,
Pois, ainda que o verdugo o mata,
A memória persiste em sua eternidade.
Ó mãe, senhora de um destino cruel,
Que gera vida onde o algoz semeia a dor,
Tu és o lume que rompe o véu,
Tu és a raiz de um mundo em labor.
E se os algozes bebem de tua essência,
Enganam-se ao crer-te submissa,
Pois em teu peito reside a resistência,
Que transforma lágrimas em justiça.
Teu ventre pulsa com força infinita,
Como um tambor que clama por redenção,
E cada vida que a dor limita
Traz consigo o peso de uma nação.
A História há de lembrar, mãe escrava,
Que foste tu quem ergueu o império vil,
E o futuro, que hoje a liberdade alava,
Será teu monumento, eterno e gentil.
Assim, negra flor, ergue-te altiva,
Mesmo ferida, és fonte de renascer,
Pois o mundo que te mata também deriva
Da força imensa do teu ser.
Maria das montanhas
19/10/2019