A reforma política entrou novamente em pauta após o discurso de Dilma Rousseff como presidente reeleita, no domingo (26/10). O tema, discutido há mais de 20 anos pelo Congresso, nunca avançou, ainda que, como acontece no atual governo, Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva tivessem maioria na Câmara e no Senado.
O tema voltou à tona durante as manifestações que levaram milhões de brasileiros às ruas em junho de 2013. Uma das principais reivindicações era uma reforma política profunda e o combate à corrupção. Em resposta, Dilma acrescentou a reforma política em um dos cinco pactos que elaborou então. Porém, a proposta não foi acolhida nem pela base de apoio da presidente.
Hoje, a reforma defendida por Dilma consiste no fim das doações de empresas privadas; voto em lista em dois turnos (primeiro numa lista de candidatos apresentados pelos partidos e, depois, num candidato específico); paridade entre homens e mulheres nas listas partidárias; e fim das coligações proporcionais (mecanismo em que partidos se aliam para eleger candidatos ao Legislativo).
Mas, de acordo com especialistas ouvidos pela DW Brasil, a reforma, por mexer com diversos interesses da classe política brasileira, não deverá sair do papel. E tanto faz se o modelo escolhido seja o plebiscito ou referendo – defendidos em entrevistas dadas por Dilma nesta semana – ou a convocação de uma Constituinte exclusiva.
Num plebiscito, os eleitores são convocados a opinar antes da elaboração da lei. A decisão entre presidencialismo, parlamentarismo e monarquia, em 1993, é um exemplo. No referendo, o Congresso faz a lei e os eleitores decidem se ela deve entrar em vigor, a exemplo do Estatuto do Desarmamento, em 2005. Já uma Constituinte exclusiva, de acordo com Dilma, seria convocada após a realização de um plebiscito.
Dependência do Lesgislativo
Para o cientista político Pedro Fassoni Arruda, da PUC-SP, se a reforma dependesse apenas do governo federal, seria mais fácil. Porém, é refém da correlação de forças dentro do Congresso.
E, como essa é a legislatura mais conservadora dos últimos 50 anos no Brasil, a tendência é que o tema fique somente na discussão – como está há mais de duas décadas.
“Há muita resistência de grupos poderosos no Congresso. E não existe um mínimo de consenso entre os partidos sobre o tema. Entre os exemplos, está o fato de que alguns partidos querem o fim do financiamento privado de campanhas, outros não”, afirma Arruda. “E, de acordo com a Constituição, só o Congresso pode autorizar a realização de um referendo ou convocar um plebiscito. Tudo passa pela Câmara dos Deputados e o Senado.”
Segundo o cientista político Adolpho Queiroz, do Mackenzie, não há chances reais de a reforma sair do papel. A reforma política, para ele, não interessa aos políticos e partidos, principalmente ao PT e PMDB, que foram os grandes vencedores das eleições.
“Se o sistema permanecer como está, ele beneficia tanto partidos grandes quanto pequenos”, opina Queiroz.
Pela via da Justiça
A Constituinte exclusiva seria uma das possibilidades para a realização da reforma política. Porém, não há na Constituição um artigo específico que trate sobre quem tem a competência de convocá-la. Dependendo da interpretação, isso pode ser feito pelo presidente da República ou pelo Congresso.
Numa Constituinte exclusiva, novos deputados teriam que ser eleitos somente com a função de elaborar e votar as propostas da reforma política – o que, para especialistas, pode durar mais de quatro anos. Depois da aprovação, ela seria dissolvida.
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“Se a Constituinte for convocada pelo presidente da República, isso vai parecer que é uma afronta ao Congresso Nacional”, diz a cientista política Christiane Romeo, do Ibmec/RJ. “Não sei se Dilma teria sustentação para isso, já que o PMDB, que define a governabilidade do país, pode pisar no freio em relação a isso.”
A especialista afirma que uma reforma pela via do Poder Judiciário não é impossível, mas ao mesmo tempo arriscada. Como exemplo, o STF decidiu pela constitucionalidade da chamada “Ficha Limpa”, em 2012.
Para Romeo, apesar de não ser um poder eleito e não ter legitimidade, lentamente o STF tem influenciado as políticas públicas no Brasil.
“O STF é uma caixinha de surpresas. A Dilma vai nomear mais cinco ministros e não sabemos se a instituição vai funcionar ideologicamente por causa dessas indicações ou de forma independente”, avalia. “O STF pode estar vinculado ao PT e não sabemos se boas reformas virão daí.”
Autor: Fernando Caulyt
Edição: Rafael Plaisant