O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, FRENTE A IRRAZOÁVEL DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA
Ezequiel Ivan Santos de Lima
Graduado em Direito pela UNIFAVIP/DEVRY – Universidade Faculdade do Vale do Ipojuca – Caruaru/PE, Pós – Graduando em Ciências Criminais pela Faculdade Estácio e CERS – Complexo de ensino Renato Saraiva. Associado ao IBCCRIM – Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.
Advogado.
Diante das inúmeras modificações, que nosso Código Processual Penal vem sofrendo ao longo das últimas décadas, em especial no que concerne às prisões, desde o advento das Leis nºs 11.689/2008, 11.690/2008, 11.719/2008 e 11.900/2009, até atingir a Lei nº 12.403 de 04 de maio de 2011, se vê a necessidade de um estudo mais aprofundado no que diz respeito a modalidade de prisão cautelar de natureva preventiva, levando-se em consideração o tempo de sua aplicabilidade sobre o indivíduo.
Em várias discursões que vêm sendo enfrentadas pelos Tribunais Pátrios e pelos estudiosos do direito, em estabelecer qual seria o tempo razoável da medida preventiva, uma vez que, a prisão em nosso ordenamento juridico é medida de extrema excepcionalidade, mas, diferentemente da realidade, podemos perceber que essa modalidade de prisão estende-se anos após anos, infringindo os princípios processuais penais e constitucionais, em especial o art. 1º, inciso III e o art. 5º inciso LXXVIII, da Contituição Federal de 1988.
Desta forma a Carta Magna Federativa de 1988 elenca o princípio da dignidade da pessoa humana como sendo um direito fundamental, no qual deve ser observado, em relação a irrasoável duração da prisão cautelar de natureza preventiva. Ante os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da razoável duração do processo, ou seja, o direito de ser julgado em um prazo razóavel, é importante observar que a prisão preventiva tem seu fim com a prolação de uma sentença penal condenatória, ou seja, é a mais ampla dentre as prisões de natureza cautelar, uma vez que, essa modalidade de prisão se dará durante a fase de investigação e durante à fase processual. Na esteira do magistério de Julio Fabbrine Mirabete, é uma medida cautelar, constituída da privação de liberdade do indigitado autor do crime e decretada pelo juiz durante o inquérito ou instrução criminal em face da existência de pressupostos legais para resguardar os interesses sociais de segurança[2].
Cumpre analisar o choque existente entre o tempo absoluto do direito e, o tempo subjetivo do réu, especialmente no que se refere ao direito de ser julgado em um prazo razóavel, quanto à grave consequência da inobsêrvancia desse direito fundamental, onde ninguém deve ser mantido no carcére sem que tenha sobre ele uma pena condenatória transitada em julgado.
Frisa-se a omissão existente na legislação processual, ao tratar do tempo de duração para se cumprir uma prisão preventiva a omissão e a (in)razoabilidade, são afrontas literais o que o indivíduo tem de mais precioso, a sua dignidade.
Sintetizando uma conceituação do que seria dignidade humana, nos faz retornar à Roma antiga, atravessar a Idade Média e e chegar até o surgimento do Estado Liberal, a dignidade –dignitas – era um conceito associado ao status pessoal de alguns indivíduos ou à proeminência de determinadas instituições. Como um staus pessoal, a dignidade representava a posição política ou social derivada primariamente da titularidade de determinadas funções públicas, assim como o reconhecimento geral de realizações pessoais ou de integridade moral.
Em extraordinária lição de Luís Roberto Barroso, assegura que: “De modo geral, a dignidade era equivalente à nobreza, implicando em tratamento especial, direitos exclusivos e privilégios. Tendo essas premissas como base, não parece correto entender a ideia contemporânea de dignidade humana como um desenvolcimento histórico do conceito de dignitas hominis”[3]. Em relação às origens filosóficas da dignidade humana, o grande orador e estadista romano Marco Túlio Cicero[4] foi o primeiro autor a empregar a expressão “dignidade do homem”. O conceito surgiu, portanto, com contornos puramente filosóficos, derivados da tradição política romana, sem qualquer conotação ou conexão religiosa.
Seguindo a orientação das prisões processuais, sob a ótica da Lei nº 12.403/11, observa-se algumas peculiaridades dentre as prisões processuais, em especial à prisão preventiva. A prisão em flagrante, estatuída e regulamentada nos arts. 301 e 310 do Código de Processo Penal, é uma modalidade de prisão em que o seu tempo implícitamente se encerra quando o magistrado recebe o auto da prisão em flagrância, ou seja, recebendo os autos o juiz deverá aplicar algumas das hipóteses do art. 310 do mesmo diploma legal. Entende-se que essa modalidade de prisão terá o seu prazo final, quando da análise dos autos pelo magistrado, apesar de não existir expressamente na lei, mas à própria lei estabelece providências cogentes a serem adotadas, assim implícitamente o prazo de encerramento da prisão em flagrante, entende-se que o seu prazo se encerra em 24 horas. Assim é o entendimento de Guilherme de Souza Nucci “Cuidando-se de prisão, os prazos fixados em lei precisam ser fielmente respeitados, sob pena de se configurar constrangimento ilegal, com a consequente soltura do preso. (…) tratando-se de prisão, ato constitutivo de cerceamento da liberdade, não se deve admitir concessões de prazo (…), impreterivelmente, em 24 horas, contadas a partir do momento da prisão – e não do término da lavratura do auto de prisão em flagrante[5].
Passando a análise da prisão temporária, medida cautelar, regulada por lei específica “Lei nº 7.960/1989”, esta indica em seu próprio texto a duração da prisão, estabelecendo o prazo de 5 (cinco) dias, prorrogado por igual período e 30 (trinta) dias prorrogados por igual período. Essa modalidade de prisão disciplina o seu cabimento apenas durante as investigações, sem restringir-se ao inquérito policial.
Analisando a prisão cautelar de natureza preventiva, observa-se que não existe previsão legal quanto a seu tempo de duração, sendo uma questão delicada que deve ser observada de maneira peculiar. Diante da omissão de prazo na lei em decorrência da prisão preventiva, sabidamente a mais abrangente de todas, o que acaba gerando indefinições e não raramente abusos por parte do Poder Judiciário, ao permitir prisões preventivas por longos períodos, acarretando elevado gravame para a situação do individuo encarcerado, principalmente, no que desrespeito a sua dignidade, tendo sua liberdade cerceada antes de uma possível sentença condenatória transitada em julgado, sendo principalmente um desrespeito aos princípios constitucionais da dignidade humana e da presunção de inocência. Não deixando de se considerar a patente violação dos direitos da dignidade humana, em relação aos presos, detentos em presídios brasileiros, em relação a esses, são anda atuais as colocações de Francesco Carnelutti: “Sob um certo aspecto, pode-se assemelhar a penitenciaria a um cemitério; mas se esquece que o condenado – e acrescentamos, também o preso provisório – é um sepultado vivo[6]”
É justamente neste sentido que a dimensão ética e jurídica assume particular relevância à constatação de que a dignidade da pessoa humana é simultaneamente limite dos poderes estatais. Neste contexto, a toda a atividade estatal e todos os órgãos públicos são impostos um dever de abster-se de ingerências na esfera individual que sejam contrárias à dignidade pessoal. Neste sentido Ingo Wolfgang Sarlet: “Poder entender, portanto, que o princípio da dignidade da pessoa humana constitui o reduto intangível de cada individuo e, neste sentido, um estreito entrelaçamento entre os direitos fundamentais. Salienta-se que para além da tríada vida, liberdade e igualdade, também há outros direitos fundamentais que podem ser reconduzidos e considerados como exigência ao princípio da dignidade humana”[7].
Tomando por premissa a norma fundamental da dignidade humana constante na Carta Magna de 1988, torna-se fácil perceber que todo e qualquer processo e ou prisão deve ser sem dilações temporais indevidas. Dessa forma em respeito ao princípio da dignidade humana, ninguém deverá ser preso por mais tempo que a lei permita; sabendo que nossa atual legislação é omissa quanto a prazos em relação à medida cautelar da prisão preventiva. Ninguém poderá ficar encarcerado, até o bem prazer do estado juiz.
A despeito de o princípio da duração razoável do processo já existir expressamente no sistema jurídico pátrio desde 1992, com a incorporação do Pacto e San José da Costa Rica, a inclusão do inciso LXXVIII no artigo 5º da Carta Magna. A Emenda Constitucional nº 45/2004, cujo texto foi promulgado em 8 de dezembro de 2004, agasalhou o princípio da celeridade processual no art. 5º, LXXVIII da Constituição, onde assegura a todos, no âmbito judicial, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
O prazo da prisão preventiva permanece com uma incógnita em nosso ordenamento jurídico, tendo se tornado ainda mais controversa a partir da reforma do Código de Processo Penal, a qual alterou os prazos dos procedimentos. Os requisitos analisados pelo Supremo Tribunal Federal, sobre o excesso de prazo da prisão preventiva, percebe-se que alguns requisitos são constantemente trazidos à tona no momento de definir a razoabilidade da medida, trazendo fundamentos objetivos para determinar a limitação do tempo razoável da prisão preventiva. Tal preceito, o Princípio da Razoabilidade evidencia-se no princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III da CF/88).
Desta forma, a demora irrazoável da prisão preventiva, é uma afronta à dignidade da pessoa humana, face à omissão atual da legislação processual penal, diferentemente do Anteprojeto do Novo Código de Processo Penal, que estabelece prazos máximos de duração da medida cautelar de natureza preventiva.
BIBLIOGRAFIA
[1] MIRABETE, Júlio Fabbrini, Processo Penal. 17ª. Ed. São Paulo: Atlas, 2005.2 BARROSO, Luís Roberto, A dignidade da pessoa humana no direito constitucional Contemporâneo, A constituição de um Conceito Jurídico à Luz da Jurisprudência Municial: Belo Horizonte: Fórum 2013.
3 NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Comentado, 12 ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2013.
4 CARNELUTTI, Francesco, As Misérias do Processo Penal, 1ª ed. Campinas: Russell Editores, 2007.