14/11/2014 21h09 –
Jorge Beltrão pegou 23 anos; Bruna e Isabel foram condenadas a 20 anos.
Eles ainda responderão por outras duas mortes ocorridas em Garanhuns.
O trio de canibais foi condenado, na noite desta sexta-feira (14), por homicídio quadruplamente qualificado, vilipêndio (violação) e ocultação do cadáver de Jéssica Camila da Silva Pereira, 17 anos. O crime ocorreu em maio de 2008. Jorge Beltrão Negromonte da Silveira pegou 21 anos e seis meses de reclusão e um ano e seis meses de detenção, totalizando 23 anos. Já as rés Isabel Cristina Torreão Pires e Bruna Cristina Oliveira da Silva pegaram 19 anos de reclusão e um ano de detenção, totalizando 20 anos. A sentença foi lida pela juíza Maria Segunda Gomes de Lima, que presidiu o júri popular no Fórum de Olinda, Grande Recife. A defesa dos réus informou que vai recorrer da decisão.
“Os jurados entenderam que os réus são culpados e, com base no artigo 59 do Código Penal, foi aplicada uma pena determinada a casa um deles, especificamente depois de analisar todos os antecedentes, culpabilidade, comportamento”, disse a magistrada, acrescentando que, nesse caso, não coube a pena máxima. “Pena máxima a gente aplica quando tem condenação e outros processos já julgados, o que não é o caso deles. Um [Jorge] responde a outro processo, mas não tem condenação. No caso dos outros crimes que ele responde na cidade de Garanhuns, pode ser que isso desfavoreça a pena dele”, explicou.
Segundo o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), pelo menos um sexto da pena de reclusão só pode ser cumprida em regime fechado. Já no caso da detenção, essa pena pode ser cumprida em regime semiaberto ou aberto. A decisão levou em conta quatro agravantes do homicídio (motivo fútil, emprego de meio cruel, sem dar chance de defesa à vítima e para assegurar impunidade).
Jorge Beltrão ainda foi condenado a pagar 320 dias-multa e as rés, 120 dias-multa. O valor será estabelecido pela Vara de Execuções Penais e pode ser cobrado depois do cumprimento das penas. A multa será paga ao Fundo Penitenciário.
Inicialmente, Jorge Beltrão Negromonte da Silveira volta ao Complexo do Curado, na Zona Oeste do Recife, mas deverá cumprir a pena na Penitenciária Barreto Campelo, em Itamaracá, na Região Metropolitana, quando não couber mais recurso. Isabel Cristina Torreão Pires e Bruna Cristina Oliveira da Silva serão encaminhadas à Colônia Penal de Buíque, no Agreste.
A promotora Eliane Gaia lamentou a redução da pena, mas estava satisfeita com a decisão do júri. “O MPPE [Ministério Público de Pernambuco] fez o seu trabalho junto à sociedade e o corpo de jurados nos atendeu. A pena faz parte do nosso código e a confissão ajudou na redução”, afirmou. Ela não pretende recorrer da sentença.
A vítima era moradora de rua, tinha 17 anos, uma filha de um ano e aceitou viver com os acusados. Eles planejaram ficar com a criança depois de matar a mãe, segundo a denúncia do Ministério Público de Pernambuco (MPPE). Os três réus foram acusados de terem guardado a carne da jovem para consumo humano, além de ter ocultado os restos mortais.
Longo julgamento
O júri foi realizado em dois dias. Teve início na quinta (13), mas foi suspenso à noite a pedido do MPPE e da defesa dos réus. Recomeçou na manhã desta sexta e terminou por volta das 19h30.
No primeiro dia, o trio foi hostilizado ao chegar ao Fórum de Olinda e trocou acusações entre si durante os depoimentos. Eles contaram detalhes macabros da ação e uma das rés, Bruna Cristina, disse que “Jogos Mortais perdia” ao descrever o assassinato de Jéssica. A mulher afirmou que chegou a comer a carne da vítima por causa do ritual.
Nesta sexta, Jorge Beltrão foi o primeiro dos réus a chegar ao Fórum para o segundo dia da sessão. Às 9h30 chegaram as outras duas rés, Isabel Cristina e Bruna Cristina. Antes do julgamento começar, Bruna mostrou um papel a Jorge. Isabel estava chorosa e parecia bastante nervosa.
A fase de debates no último dia começou por volta das 9h40. A sustentação oral da representante do Ministério Público de Pernambuco durou 2h30, mesmo tempo destinado aos defensores dos réus. Houve réplica e tréplica. Terminada essa etapa, os sete jurados que compunham o Conselho de Sentença reuniram-se para responder a quesitos e votar pela absolvição ou condenação. Com base na votação, a juíza realizou a dosimetria da pena e leu a sentença em plenário.
Ilana Casoy esteve no Fórum de Olinda para
acompanhar júri dos canibais
(Foto: Luna Markman/G1)
Caso deve virar filme
O julgamento do trio acusado de canibalismo atraiu a pesquisadora e escritora Ilana Casoy a Pernambuco. Uma das maiores especialistas em serial killers do Brasil, ela pretende fazer um documentário sobre a história que chocou o país em 2012, com a descoberta de outros dois homicídios atribuídos ao trio em Garanhuns, no Agreste do estado.
Casoy acompanhou o caso desde o início, tendo tido inclusive a chance de entrevistar os réus. “Todos os crimes com mais de duas vítimas que envolvem um ritual me chamam atenção. Neste caso, o que se destaca é que a gente tem três assassinos e três versões diferentes. Aqui [no julgamento], eles já têm outras versões, que não foram as que eu ouvi antes, então são seis ao todo. [As versões] não são controversas, às vezes são até complementares, mas é difícil saber exatamente o que aconteceu, o que é verdade e o que não é”, disse.
Outros crimes em Garanhuns
O trio ainda é acusado de assassinar em Garanhuns, no Agreste do estado, Giselly Helena da Silva, 31 anos, e Alexandra Falcão da Silva, 20 anos, mortas, respectivamente, em fevereiro e março de 2012. O julgamento relativo a esse processo ainda não foi marcado pela Justiça estadual.
Os acusados afirmam fazer parte da seita O Cartel, que visa a purificação do mundo e o controle populacional. A ingestão da carne faria parte do processo de purificação. O caso veio a público depois que parentes de Giselly Helena da Silva denunciaram o seu desaparecimento. Os acusados usaram o cartão de crédito da vítima em lojas de Garanhuns e foram rastreados pela polícia.
Uma publicação contendo os detalhes dos crimes – registrada em cartório – foi encontrada na casa dos réus. Para a Polícia Civil de Pernambuco, não há possibilidade de outras mortes terem sido praticadas pelo trio no estado.